Certamente você já ouviu falar na confidencialidade que envolve os profissionais da saúde, sendo que esta é mais atribuída aos médicos.

Entretanto, o que muitos não sabem é que a confidencialidade também se estende a outros profissionais, como enfermeiros e dentistas.

Neste artigo, vamos entender como essa confidencialidade entre paciente e dentista é aplicada após o falecimento do paciente e se a família pode ter acesso ao prontuário odontológico.

O juramento de Hipócrates x Juramento da Organização Mundial da Saúde

Apesar de ser mais conhecido para os médicos, também há uma versão do juramento de Hipócrates para os dentistas.

Porém, na versão da odontologia não há nenhum trecho que trata sobre a confidencialidade entre dentistas e pacientes.

Esse dever, contudo, está expresso no Juramento da Organização Mundial da Saúde – OMS, restrito aos cirurgiões-dentistas.

O Juramento da OMS é expresso ao determinar que é dever do cirurgião-dentista “respeitar os segredos que me forem confiados”.

Assim sendo, tem-se que essa também é uma obrigação de todo cirurgião-dentista. Mas até que ponto vai essa confidencialidade?

É possível a família de um paciente ter acesso ao seu prontuário odontológico?

A quem pertence o prontuário odontológico?

O prontuário odontológico pertence ao paciente. Porém, de acordo com o Código de Ética Odontológico, o cirurgião-dentista é quem tem a guarda do documento.

Entretanto, é direito do paciente ter acesso ao seu prontuário, sempre que solicitar. É importante lembrar, contudo, que o original jamais deve ser retirado do consultório do dentista, devendo ser fornecida ao paciente uma cópia.

Vejamos o que diz o artigo 5º do Código de Ética Odontológica sobre o tema:

“Art. 5º Constituem deveres fundamentais dos profissionais e entidades de Odontologia: (…) VII) elaborar e manter atualizados os prontuários de pacientes, conservando-os em arquivo próprio; (…) XVI) garantir ao paciente ou seu responsável legal acesso a seu prontuário, sempre que for expressamente solicitado, podendo conceder cópia do documento, mediante recibo de entrega.”

E quando o paciente falece, a família pode solicitar o prontuário odontológico?

A morte de um paciente não extingue o dever de sigilo do cirurgião-dentista.

Isso porque a Constituição garante que, mesmo com o fim da personalidade, os direitos personalíssimos persistem. Assim, a inviolabilidade da intimidade, honra e imagem não cessam com a morte.

Entretanto, caso a família solicite o prontuário odontológico para fins juridicamente lícitos, deve o cirurgião-dentista fornecer cópia do prontuário do paciente falecido.

A confidencialidade dentista-paciente deve ser afastada apenas em casos específicos. Alguns motivos aceitos são os de verificação da causa da morte, recebimento de seguro de vida ou com o intuito de tomar medidas judiciais cabíveis, mesmo que seja contra o cirurgião-dentista.

Vale ressaltar, contudo, que o cirurgião deve tomar alguns cuidados para a liberação de cópia do prontuário odontológico.

Quem pode solicitar cópia do prontuário odontológico de paciente falecido?

A cópia do prontuário odontológico falecido pode ser fornecida apenas quando solicitada pelo cônjuge ou companheiro ou por parentes de até 4º grau.

Porém, o cirurgião deve tomar algumas preocupações antes de liberar a documentação.

Cuidados necessários antes da liberação de cópia de prontuário odontológico de paciente falecido

O primeiro cuidado que o cirurgião-dentista é solicitar documentos que comprovem a relação de parentesco, matrimônio ou união estável antes de fornecer cópia do prontuário odontológico do paciente falecido.

Ainda, deve preparar um termo de compromisso e confidencialidade, que deve expressamente conter o motivo da solicitação do prontuário odontológico.

O termo deve, ainda, proibir que as informações pessoais do paciente sejam liberadas por motivos que não sejam exclusivamente para a defesa dos direitos de personalidade do paciente falecido ou para evitar danos aos parentes.

O cirurgião-dentista pode se recusar a fornecer cópia do prontuário médico de paciente falecido?

Como dissemos no início deste artigo, embora fique sob a guarda do cirurgião-dentista, o prontuário odontológico pertence ao paciente.

Portanto, o proprietário pode livremente dispor de sua propriedade. O paciente pode expressamente requerer ao seu cirurgião-dentista que mantenha sob sigilo seu prontuário. Ainda que haja a solicitação do cônjuge, companheiro ou parente de até 4º grau.

Nesse caso, o paciente deve formular seu pedido por escrito ao cirurgião, que deverá anexar a declaração de vontade do paciente ao prontuário.

Caso seja solicitado a fornecer a referida documentação, o cirurgião deverá fundamentar sua recusa em liberar cópia do prontuário na manifestação de vontade de seu paciente.

Negativa da liberação diante de decisão judicial

O cirurgião-dentista pode, de repente, se ver em uma situação delicada. Imagine se um paciente expressamente exprime seu desejo de não permitir a liberação do seu prontuário a familiares ou terceiros.

A família, por alguma razão, ingressa com ação judicial de exibição de documentos solicitando a referida documentação.

E agora, o que o cirurgião deve fazer?

Infringir o Código de Ética Odontológica e exibir a documentação ou respeitar a vontade do seu paciente falecido, não liberar o prontuário e descumprir uma decisão judicial?

Ainda que diante de uma decisão judicial, o posicionamento do cirurgião-dentista deve ser firme no sentido de não liberar o prontuário do paciente falecido.

Isso porque, como foi dito anteriormente, o direito à privacidade, à honra e a imagem são garantias constitucionais invioláveis.

À luz do direito, a melhor alternativa diante desse caso prático seria recorrer da decisão do magistrado para uma instância superior, por meio de agravo de instrumento ou outro recurso cabível.

Conclusão

O Código de Ética Odontológico estabelece que o prontuário odontológico é propriedade do paciente.

Entretanto, caso, após a morte do paciente, o cônjuge, companheiro ou parente de até 4º grau solicite o prontuário, o mesmo deverá ser liberado pelo cirurgião dentista.

Entretanto, caso o paciente, antes de falecer, manifeste expressamente seu desejo em não permitir que familiares e terceiros tenham acesso ao seu prontuário, o cirurgião-dentista não deve fornecer cópia do prontuário odontológico de pessoa falecida.

Mesmo diante de decisão judicial, a privacidade, honra e imagem do paciente devem ser respeitadas e sua vontade deve prevalecer.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *